domingo, 18 de abril de 2010

A gestação do choque

* Waldyr Senna Batista

O sucesso alcançado pelo governador Aécio Neves com o choque de gestão tem levado governadores e prefeitos a adotar o sistema. Que não é infalível e nem realiza milagres. Nem todos sabem que, para obter êxito com esse programa, estados e municípios precisam atender a pré-requisitos que abranjam até o período anterior à posse do governante, com procedimentos a serem perseguidos sem esmorecimento durante longo prazo, que pode chegar a consumir metade do mandato. Trata-se de medidas impopulares, com eliminação de influências eleitoreiras, além de (e principalmente) adoção de rígido controle de gastos. Demissões não são descartadas. O administrador que se dispuser a tanto, precisa estar consciente de que enfrentará desgaste político e se transformará em alvo da insatisfação de correligionários e financiadores de campanha impacientes, que geralmente batem à porta mal se anuncia o resultado das urnas.Choque de gestão na administração pública é um processo. O governador Mário Covas, de São Paulo, foi o precussor dessa modalidade de governar. Transformou-se em saco de pancadas, mas persistiu no propósito e conseguiu reverter a situação na segunda metade do período. Reelegeu-se.
Aécio Neves, com outro estilo, por ser mineiro, adotou o programa, alicerçado por rigorosa reforma fiscal e forte esquema publicitário. Saneou as finanças do Estado e realizou o maior conjunto de obras já visto. Não só se reelegeu como saiu consagrado. Em Montes Claros, só depois de decorridos 15 meses do mandato, o prefeito Luiz Tadeu Leite anunciou sua adesão ao modismo da atualidade. Deveria tê-lo feito no primeiro dia. Sua meta é economizar R$ 20 milhões em um ano, para serem aplicados, ao que ele diz, no atendimento à saúde, em obras públicas e outros serviços. Isso se daria, segundo o prefeito, com medidas que evitem desperdícios e custos desnecessários.
O propósito é louvável, mas, por estar chegando um pouco tarde, tem reduzida sua margem de êxito. Até agora, o prefeito fez tudo o que o manual reprova, a começar pelo inchaço do quadro de pessoal. Tendo assumido a Prefeitura com absurdos 8 mil servidores e, pressionado pelo Ministério Público, anunciou a demissão de 4 mil contratados, que estariam em situação irregular. E agora surpreende, revelando que o número de funcionários, em vez de diminuir, aumentou, chegando a 9.900.
Ainda que as demissões anunciadas não tenham sido efetivadas ou que parte desse contingente tenha sido readmitida, o crescimento do empreguismo foi assombroso. E o próprio prefeito, em entrevista, confessa que boa parte desses servidores foi contratada por indicação de vereadores, deputados estaduais e federais e por partidos que lhe deram sustentação na campanha eleitoral. Consta que a “quota” pessoal de cada vereador, nesse festival custeado pelo contribuinte, foi de cinquenta indicações, o que explica o fato de, na Câmara de 15 representantes, o prefeito ter o respaldo sistemático de 15. Isso mesmo: unanimidade. O pior é que, enquanto o custo da folha de pagamento crescia ( R$ 13 milhões/mês), a arrecadação desabava: de quase 15 milhões, chegou a R$ 7 milhões, devido à crise da economia mundial do ano passado, estando atualmente em R$ 9 milhões, com previsão de que só em 2011 alcançará a cifra anterior à crise. Qualquer empresa, num quadro semelhante, seria dada como falida. Mas o poder público não “quebra”. Deixa de realizar serviços essenciais e faz com que piore a qualidade de vida da comunidade. O administrador erra e o povo é quem sofre. O fato de o prefeito estar anunciando esse choque de gestão extemporâneo equivale a dizer que a administração não conseguiu decolar, decorrido um terço dos 48 meses do mandato. Espremida entre duas eleições, ela se vê manietada por compromissos eleitoreiros e dificuldades legais para obter repasses para obras. O choque em gestação constitui a cartada de desespero.

* Waldyr Senna Batista é jornalista e colunista do Montes Claros.com

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